Friday, May 27, 2016

Lindo Painel Azulejar em Vila Valqueire



Uma grande casa em Vila Valqueire que, se não chega a ser linda, arrebatou-me por ter não um ou dois, mas quatro grandes painéis azulejares. Quem descobriu foi o Rixa. Até há pouco foi curso de inglês e informática, hoje fechada. Pior assim: fosse ainda curso eu inventava interesses, ia entrando, perguntando, registrando tudo. Do jeito que está, os painéis ali, tantálicos. Depois de alguma hesitação e pesquisa, o pequeno misdemeanour: pulo ligeiro o muro baixinho e fotografo, ao menos, o painel do térreo. Crime passional. Saio contentíssimo, agarro o velho vendedor de bananadas do sinal e arrebato-lhe todo o estoque, ele de olhos esbugalhados.


Um grande painel de 180 peças, com moldura de gesso, na incomum cor ocre, a retratar a Fortaleza de Cabo Frio. Assina-o e data-o Filippo Bosi (parente do Alfredo?), em 1950. Ou seja, quase 70 anos e os carros passando para lá e para cá, como se nada. Valeu ou não a aventura (e as 27 bananadas)?


Não sei tinha alguma coisa na bananada, mas reparem como nas pedras distingue-se uma grande cabeça de javali, com dente e tudo.


Da mesma cor, estes daqui do Clube Monte Sinai, na Tijuca.







Monday, May 23, 2016

Sunday, May 22, 2016

O Estilo Missões / Neocolonial Hispânico por aí

Alto da Boa Vista
POR ocasião das comemorações do centenário do Grajaú organizou-se um passeio pelo bairro com paradas em pontos arquitetônicos e históricos interessantes. Uma das paradas foi em uma pequena casa térrea na Mearim, quase esquina com a Itabaiana, apresentada como representante do estilo neocolonial hispânico ou Missões. Eu, que jamais ouvira falar de tal cousa, admirei a casa com muito interesse.

Apenas para, passado algum tempo, perceber que o Grajaú está cheio de representantes do estilo. Na verdade, a cidade inteira está, digo-o com a certeza de quem, com a ajuda inicial do Raul Félix de Sousa e Jorge Luís Stocker, aprendeu a reconhecê-lo. Raul reuniu algumas fotos no Panoramio aqui. Jorge tem um ótimo artigo sobre o Missões em seu blog aqui.

Criado nos Estados Unidos, o estilo é a tentativa de arquitetos do início do século XX em adequar seus trabalhos ao clima dos territórios tomados ao México. Ou seja, inspiraram-se em obras que espanhóis e mexicanos haviam realizado por lá. Acho importante adjetivar: "hispânico". Porque falar apenas "neocolonial" aqui no Brasil seria induzir ao erro de que o estilo seria uma tentativa de se reler o que fora realizado pelos portugueses. O que não é o caso, embora, claro, o estilo tenha adquirido por aqui feições próprias, o que é ótimo, porque cultura é isso: canabalizadora.

Embora se veja em construções do estilo o célebre pequeno painel de santinho, com quatro azulejos (escrevi aqui), este painel amiúde é geométrico apenas, e arrisco dizer que, ao menos entre nós, isto simbolizaria desejos / veleidades de uma classe média ansiosa por romper com o passado purtuguês, principalmente porque o estilo, em que pese o nome, chegou-nos via Estados Unidos e foi propagado via cinema e televisão. No pós-guerra, abraçar o estilo significava romper definitivamente com a influência lusa e, de quebra, com a francesa, que se tornara obsoleta. Ficou chique mascar chiclete. Mesmo em um bairro como o Grajaú, nascido em 1914, momento de grande simpatia pela França, o que explica um Largo do Verdun, uma Marechal Jofre.

No Rio grandes representantes do gênero são o Hospital Gafrée Guinle, na Tijuca, a sede do Botafogo e a belíssima sede do C.R. Vasco da Gama. Natural supor que, neste último caso, a construção tenha mesmo assimilado elementos do neocolonial luso, de vez que, afinal, estamos a falar do Vasco...

Raul encontrou no Grajaú, na Canavieiras, uma beldade que, para ele, seria porventura a mais digna representante do estilo. Admiro a casa e a conheço desde os tempos de eu menino, quando ali moravam dois colegas da natação.


E aí começamos nossa amigável (e implacável) competição amistosa. Pois encontrei no Alto da Boa Vista e na Praça Seca duas mocetonas que deixam a casa do Grajaú no chinelo. =)


Com perdão do Raul. E dos meus (literalmente) velhos colegas da natação.

Alto

da Boa Vista

Praça Seca (e as três seguintes)




Tijuca
Paquetá

Grajaú (até segunda ordem)



A da visita guiada

A beldade do Raul

Cascadura

Méier

Saturday, May 21, 2016

Painel Azulejar de São Lourenço



Pela primeira vez, eu que tenho percorrido as platibandas da cidade, encontro um pequeno painel azulejar de santinho dedicado a... São Lourenço. Na Rua Barão, no que chamam de Praça Seca, no grande bairro de Jacarepaguá.

Há mesmo inscrição S. Laurentius, mas digo-o sem jactâncias que a dispensei, posto que aprendi a reconhecer os santos pelos seus atributos, e o do Lourenço de Huesca é a sua grelha, nesse estranho costume católico de identificar o martirizado com o instrumento do seu martírio (não é assim com a cruz?). Esta grelha conheço-a bem, porque, afinal, morei muitos anos em cidade com duas igrejas dedicadas a ele (aqui). 

Dizem que este espanhol do século III era bem-humorado. Enquanto estava sendo queimado vivo, disse "Podem me virar agora, pois este lado já está bem assado", o que me lembra um dos acusados de feitiçaria de Salem, Giles Corey, sendo martirizado sob o peso de uma pedra e pedindo "More wight!"

Pequeno painel um pouco maior que os habituais: nove azulejos aqui. Singela moldura da mesma pedra que recobre toda a casa. Sem assinatura. Lícito supor que seja do Igrejas.

Friday, May 20, 2016

Pisos de Caquinhos na Praça Seca



Não direi que olham feio. Olham com aquele olhar guardado para os doidos. É o que recebo quando direciono a lente do meu Nokinha para o chão, para o piso de caquinhos. I can't help it. Acho é estranho que não queiram, todos, registrar isso.

Vejam que lindezas.

Mais postagens com pisos de caquinhos aqui e aqui.










Estes os Dias



Palavra-puxa-palavra, numa postagem em que falei na Rachel de Queiroz marquei a Nélida, amiga que estava comigo na visita. Ela comentou algo como 'bons tempos aqueles', ao que repliquei com 'tá, but these are the days'.

Verdade. Olhando por uma lente naquela tarde da visita da Rachel eu tinha a liberdade de, ao sair, poder ir / fazer o que quiser. Hoje tenho Dante, trabalho, Camila. 

Não troco por nada. E, de quebra, lembrei dos 10,000 Maniacs.

These are days. E eu tinha, eu que já escrevera aqui, tinha esquecido como a Natalie é linda.

Wednesday, May 18, 2016

Morro da Babilônia da Poesia




São duas as favelas
Mas o morro é um só


O Morro da Babilônia, talvez por chamar-se como se chama, está bem representado na literatura brasileira: menção nada desprezível em Bandeira, central em Drummond e em Elizabeth Bishop.

Está presente em poema de Bandeira como local de moradia de João Gostoso (escrevi recente aqui).

Em Drummond, poema antigo de Sentimento do Mundo (1940), ouvem-se as vozes "que criam o terror". Em uma época anterior a CV, TC, ADA, no entanto, as vozes "não são propriamente lúgubres". Drummond nunca é ingênuo. Mas em época de Estado Novo era bom olhar pra cima e suspirar por liberdades e inocências perdidas. (A melhor caracterização do morro / favela nessa clave estará ainda em "Chão de Estrelas": "Meu barracão no morro do Salgueiro / Tinha o cantar alegre de um viveiro" (...) "Nossas roupas comuns dependuradas / Na corda, qual bandeiras agitadas / Pareciam um estranho festival / Festa dos nossos trapos coloridos".)



À noite, do morro
descem vozes que criam o terror
(terror urbano, cinquenta por cento de cinema,
e o resto que veio de Luanda ou se perdeu na língua
geral).

Quando houve revolução, os soldados se
Espalharam no morro,
O quartel pegou fogo, eles não voltaram.
Alguns, chumbados, morreram.
O morro ficou mais encantado.

Mas as vozes do morro
Não são propriamente lúgubres.
Há mesmo um cavaquinho bem afinado
que domina os ruídos da pedra e da folhagem
e desce até nós, modesto e recreativo,
como uma gentileza do morro.

O poema de Elizabeth Bishop é o mais longo: 47 quartetos que narram os últimos dias de Micuçú, bandido foragido que procura refúgio na Babilônia, onde a tia tinha birosca. Poema muito bem traduzido por Paulo Henriques Britto, que manteve os heptassílabos com rimas nos pares. Em alguns casos, Britto nada fez senão usar o topônimo original de vez que a poeta norte-americana é quem, para o bem ou para o mal, vertera os nomes para o inglês. Tudo que é morro virou hill. Morro do Pasmado é Hill of Astonishment. Se por um lado nos faz lembrar as traduções jocosas de bairros que circulam por aí (Botafogo = Put Fire; Jacarepaguá = Alligatorguá; Abolição = Set the black people free), o resultado final é verdadeiramente bom.

Reproduzo apenas as cinco primeiras estrofes:

On the fair green hills of Rio
There grows a fearful stain:
The poor who come to Rio
And can't go home again.

On the hills a million people,
A million sparrows, nest,
Like a confused migration
That's had to light and rest,

Building its nests, or houses,
Out of nothing at all, or air.
You'd think a breath would end them,
They perch so lightly there.

But they cling and spread like lichen,
And people come and come.
There's one hill called the Chicken,
And one called Catacomb;

There's the hill of Kerosene,
And the hill of Skeleton,
The hill of Astonishment,
And the hill of Babylon.



Nos morros verdes do Rio
Há uma mancha a se espalhar:
São os pobres que vêm pro Rio
E não têm como voltar.


São milhares, são milhões,
São aves de arribação,
Que constroem ninhos frágeis
De madeira e papelão.


Parecem tão leves que um sopro
Os faria desabar
Porém grudam feito líquens
Sempre a se multiplicar,


Pois cada vez vem mais gente.
Tem o morro da Macumba,
Tem o morro da Galinha,
E o morro da Catacumba;


Tem o morro do Querosene,
O Esqueleto, o do Noronha,
Tem o morro do Pasmado
E o morro da Babilônia.

Monday, May 16, 2016

E nem dá tempo de ficar escuro

do lado de cá do túnel


Os dias não estavam bons.

Não há negociação possível ou razoável com a mãe do meu filho. Dante amorna-se em febres circadianas, alunos podem ser bastante desdenhosos, golpistas triunfam e tenho que sair para trabalhar na tarde do sábado.

No meio disso tudo, a companheira a meu lado no ônibus que pega o Túnel Velho. Apenas para que ela diga: "Este túnel é tão pequeno que nem dá tempo de ficar escuro".

Algo sorri dentro e fora de mim. Impossível não lembrar do Criança diz cada uma, do Pedro Bloch, livro que o Rosa adorava, não por tratá-la paternalisticamente como a uma criança, não é isso. É que a frase poderia mesmo ter saído do livro e saiu da companheira que estava ao meu lado durante a curta travessia do Túnel Velho, aquele que liga o cemitério São João Batista ao Bairro Peixoto.

E já não estou no túnel.

Sunday, May 15, 2016

O Barraco do João Gostoso



Lembram do João Gostoso? João Gostoso é personagem de "Poema tirado de uma notícia de jornal", do Manuel, um dos muitos do Manuel que sei de cor.

Acontece que, estando em Chicago em 1986, declamei-o para o meu então novo amigo Felipe Barroso, que achou impossível que o Bardo houvesse empregue a palavra "Gostoso", a seu ver muito moderna para a época. Eu, certo das minhas certezas e da modernidade do Manuel, firmei o pé. Mas como resolver a contenda? Não havia internet na época e o único livro de poesia que eu carregara para o exílio era o Reunião, do Drummond. Escrevi então carta para meu irmão explicando o caso e solicitando cópia xerox do poema.

Felipe e eu apostamos uma caixa de cerveja.

Meses depois, a resposta chegou. Acho que nunca recebi a caixa de cerveja, mas do ainda amigo cearense recebi nestes 30 anos bem mais que isso.

Então, para comemorar isso tudo, subi ontem o Babilônia com a Camila para localizar o barraco do João Gostoso.

Achei fácil.


POEMA TIRADO DE UMA NOTÍCIA DE JORNAL

João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.


Barraco do João Gostoso

Saturday, May 14, 2016

Dois Painéis Azulejares de Mourinho em Vila Isabel



Famosa por suas decorações de Copa do Mundo, a Rua Jorge Rudge, em Vila Isabel, acolhe a sede mundial (!) do Racionalismo Cristão. Fundado em 1956, o prédio é um tanto abrutalhado, lembrando as colossais construções faraônicas do Rei Leopoldo em Bruxelas. Faz parte do, digamos, 'complexo' o imenso chalezão ao lado, peculiar pelas suas dimensões, antiga residência do Marechal Zenóbio da Costa. Bem mais interessante. E, seguindo pela Rua do Marechal citado, descubro somente agora uma bela casa estilo neocolonial hispânico que também pertence ao Racionalismo.

Perto dos colossos, a mais simples. Também a mais bonita. E, no jardim, dois impagáveis painéis azulejares de António Mourinho. Um no tradicional azul e branco, outro policrômico. Em ambos o tema de sua preferência: a vida agrícola e paisagens das regiões campestres. O carro de bois, por exemplo, é do Douro, e vemos aqui preocupação quase etnográfica.

Mourinho trabalhou para a Fábrica Sacavém. O mercado de Vila de Franca de Xira e a estação de Mafra (sim, a cidade do convento de Blimunda e Baltazar) contém obras suas.

Vila Isabel também. Patrimônio histórico da Vila, patrimônio de todo o Rio.









Mercado de Vila Franca de Xira

Estação de Mafa

Friday, May 13, 2016

Angry Nuts : Muito Lúpulo e Avelã. Esqueceram a Cerveja



A primeira impressão, no nariz ainda: fui transportado para uma festa infantil em um play de teto baixo tocando Xuxa no último volume. A boca apenas confirmou. Mesas abarrotadas de brigadeiro. Nenhuma cerveja.

Sabe aquelas quadros na feirinha de artesanato da pracinha? Todos academiquinhos, muito sem graça, a mesma cidade histórica de sempre, a mesma marinha. Mas eu talvez eu prefira isto, como primeiro estágio, a uma tentativa ingênua de emular Miró ou Kandinsky. Neguinho quer pular pro Salvador Dalí sem um único estudo de anatomia.

Tem cerveja que é assim. Esta Suméria Angry Nuts é assim. 

Gente, se carradas de lúpulo fossem o suficiente para fazer boa IPA era fácil. Bastariam carradas de lúpulo.

E o dulçor. God, atenção para o dulçor. Quando eu quero caldo de cana eu vou na feira. Tem refil à vontade.

Pela primeira vez na vida, não consegui terminar uma IPA. E era garrafa pequena.

Na falta de mulheres no governo, um pouco da Rachel



Que alguém desgoste do governo Dilma, tudo bem. Que desgoste da Dilma, está no seu direito. Que um "jornalista" (aspas imprescindíveis, já que é dele a biografia do "ator" Reynaldo Gianecchini) afirme em seu livro Que horas ela vai? que Dilma foi a "primeira mulher sapiens a presidir o Brasil e certamente a última"... bem, isso é inaceitável. Como assim, Sr. "escritor" Guilherme Fiuza? Explica pra gente esse machismo asqueroso, essa misoginia maldisfarçada? Quem sabe a Miriam Leitão não te ajuda? Aquela mesma que defendeu o golpe e agora revela-se / finge-se indignada com a ausência de mulheres no "governo" Temer.

Haja aspas.

Aí me lembrei da Rachel, por amor de contrabalançar um pouco. Rachel de Queiroz reunia facetas não muito queridas dos paneleiros: mulher, nordestina, intelectual, escritora, comunista. Vascaína. Foi a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras, antro de barbados. Qual a flexão feminina de fardão? A roupa que Rachel usaria para a posse e sessões tornou-se (quase) um hashtag naquele 1977. O Vasco chegou a oferecer-se para comprar-lhe a indumentária.

Estive com ela em fevereiro de 1993. Eu, Nélida (não a Piñon!), Bao. Conversamos em sua sala por algumas horas. Ela autografou nossos livros, incluindo o raro A Beata Maria do Egito, uma de suas duas peças. Primeira edição de 1958, José Olympio, capa e ilustrações de Luís Jardim. Lembro-me de sua voz quando saquei o livro "Nossa, que relíquia! Nem eu tenho mais isso...."