Thursday, February 23, 2012

Dois Poetas Bissextos do Rio Comprido




Em 1946, Manuel Bandeira lançou uma Antologia de Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos, em cuja introdução escreveu: "Poeta bissexto deve, pois, chamar-se aquele em cuja vida o poema acontece como o dia 29 de fevereiro no ano civil. Esquematização grosseira. Em suma, bissexto é todo poeta que só entra em estado de graça de raro em raro." A antologia apresenta 35 poetas e traz nomes interessantes e improváveis, como os de Afonso Arinos de Melo Franco, Aurélio Buarque de Holanda, Di Cavalcanti, Euclides da Cunha, Maria Clara Machado, Rodrigo Melo Franco de Andrade (contista também bissexto, mas cujo Velórios é dos melhores que há na nossa literatura) e Rubem Braga. E, lado a lado (sim, o índice não é pelo sobrenome): Pedro Dantas e Pedro Nava.

O curioso, a coincidência, é que esses dois sujeitos já haviam vivido próximos, na Aristides Lobo, no Rio Comprido, como bem nos lembra Nava em Baú de Ossos:

"(...) onde estava, em casa dos avós, um menino que eu ainda não conhecia. Chamava-se Prudente. Chama-se Prudente de Moraes, neto, aliás Pedro Dantas. Meu vizinho na infância. Contemporaneamente nos impregnamos na Rua Aristides Lobo como se fôssemos esponjas. Quando as esprememos, por volta dos anos trinta, dele veio A Cachorra e de mim, o Defunto. Poemas do Rio Comprido. Poemas da frustração do corpo, de sofrimento de alma e corpo, da miragem de qualquer depois, nos aléns da vida e ou nos aléns da morte. Tímida esperança de recomeço, de purificação, de retomada... Em que ondes? em que quandos?"

Ambos os poemas estão devidamente antologizados no livrinho de Bandeira e digo mais: são um dos pináculos de nossa poesia. Travei contato com os dois no ano mesmo em que comecei a ler / devorar poesia a sério: em 1984, aluno do 2o ano do Ensino Médio no São José, idade e locais próprios para frustrações do corpo. De tal modo vivem em mim, que aqui mesmo neste blog fazem-se presente: de "A Cachorra" usei o verso final para descrever o que me causa o terceiro movimento do terceiro concerto para piano de Prokofiev; de "O Defunto" simplesmente roubei o primeiro verso para o meu poema para as figueiras.


Seria crueldade não citar ao menos o início dos poemas:

A Cachorra


Veio uma angústia de cima,
Pelos ombros me agarrou,
No mais fundo do meu peito
Sua lâmina cravou.
Depois que no chão desfeito
O meu corpo estrebuchou,
Pelos cabelos a fera
Sobre pedras me arrastou.


O Defunto:

Quando morto estiver meu corpo,
Evitem os inúteis disfarces,
Os disfarces com que os vivos,
Só por piedade consigo,
Procuram apagar no Morto
O grande castigo da Morte.



PS: Estive há pouco na Aristides Lobo, em busca da casa de Pedro Dantas, que fazia esquina com a Rua da Colina. O sobrado de Nava eu já sabia derrubado. Nada, nem uma parede. O nome mesmo da Colina se foi, transformado em Quintino do Vale, como também se foram os nomes Rua Leste, Rua do Morro, Rua da Paz. A Aristides Lobo, é pena, envelheceu mal. Seu início é de uma sensaboria lamentável. Que poemas, que poetas poderá ela hoje inspirar?

Tuesday, February 21, 2012

Rock Progressivo e Moda



Com os discos da fase áurea do Genesis, Peter Gabriel imprimiu com ferrete sua marca no rock progressivo. Inexorável e atemporalmente. Incontáveis influências confessas: Marillion, Citizen Cain, Kyrie Eleison, The Watch, para ficarmos com algumas.



Não precisava ele, portanto, fazer mais nada, entronizado no panteón como já está. Mas ao declarar que o rock progressivo é o estilo mais fora de moda no cenário da música atual, continua ele, hummm, como dizer, prestando-nos grandes serviços.



Porque moda, afinal, é para quem precisa. Ou, como quer Oscar: "Fashion is something so ugly we have to change it every six months."

Monday, February 20, 2012

OFF-Carnaval: Marquês de Sapucaí



Nestes dias em que a Marquês de Sapucaí é a rua mais famosa da cidade, do país e do planeta, publico foto de um trecho dela bem pouco conhecido. Aliás, nada.

Trata-se de uma vila construída no final do século XIX. São 16 casinhas cujas fachadas têm tijolo maciço aparente.

Bem tombado, mas isso hoje já não quer dizer muito, vide o Maracanã e a fábrica da Brahma.Este desconhecido trecho da Marquês de Sapucaí (sim, é a mesma rua dos desfiles, da televisão!) situa-se no sopé do Morro do Pinto. O passeio por aqui não é assim tão tranquilo, de vez que a galera do crack do Morro da Providência desceu depois da UPP e agora fuma por aqui.

Convém, portanto, ter cautela, não tirar fotos (como fiz), nem explorar (como fiz). Mas para os intrépidos, já fora da rua, existem outras belas construções e o Bar do Carlinhos.

Um Rio Comprido

Para que os araribóias pudéssemos chegar mais ligeiro à Zona Sul e para que os moradores da Zona Sul pudessem atingir o Maracanã (quando havia este) antes do apito inicial, um preço haveria de ser pago e aqui a monta foi alta, não tanto pelo Rebouças, mas pelo horroroso Elevado Paulo de Frontin, que desfigurou o Rio Comprido de modo cruel.

Como a Glória, como a Praça da Bandeira, o Rio Comprido é hoje espaço de passagem, e passagem pelo alto. Mas mesmo esta passagem permite a visão de duas jóias: a igreja de São Pedro (cuja porta pertencia à igreja de São Pedro dos Clérigos, destruída aquando da construção da Presidente Vargas) e a Casa do Bispo, ambas oferecidas do lado direito de quem vai para a Zona Sul.

Por jóias que sejam, limitar o Rio Comprido a elas é miopia. Há que se descer e flanar. Afinal, bairro que tem estas duas jóias, que tem o nome que tem, que tem uma rua chamada Estrêla (com chapèuzinho), bairro por onde tantou andou Pedro Nava, sendo mesmo o título do último capítulo de Baú de Ossos, merece mais que uma passagem.

A minha flanação não teve a pretensão de fazer todo o bairro, mesmo porque desejo voltar, de modo que não andei pelas ruas porventura mais importantes, como a do Bispo, a Barão de Itapagipe, a Aristides Lobo, Paulo de Frontin, a Praça. Começando por um botequim que há anos chamava minha atenção do alto, sempre do alto (e, que infelizmente, dadas infelizes reformas, nada tem de relevante, mas o do lado...), comecei pela Santa Alexandrina e me perdi, que conhecer um rio comprido será sempre perder-se nele, conhecendo recentos talvez desconhecidos dos próprios riocompridenses.

Encontrei fachadas esquecidas, azulejarias em frisos, fachadas e pisos, porôes altos, cantarias, botequim-armazém e a Estrêla. Lembrando Nava, sempre ele, um Rio que não há mais, esquecido pelas picaretas.


PS: Não foi esta a minha estreia no Rio Comprido, bairro onde tive amigos, como a Nélida Capela e o André Murray, e mais que isso.

PS2: Por mostrengo que seja o elevado, tenho dúvidas se seria bom pô-lo abaixo, como quer agora o alcaide com a Perimetral. Facilitar o tráfego Sul-Norte da cidade parece-me ideia inatacável e da qual, aliás, me beneficio há anos. Só que teve seu preço, como tudo.












Saturday, February 18, 2012

Letreiros Antigos da Saens Peña










Isso já rendeu livro, que tentarei localizar na Estante Virtual. Não me engano, o fotógrafo centrou-se no Largo do Machado, Flamengo, por ali.

Por acaso, cliquei esses. São espécimes em extinção, sem Greenpeace ou WWF ou IPHAN que os valha...

Esse tipo de letreiro de acrílico tinha a grande desvantagem da vulnerabilidade: uma pedrada e ptof! Estes estão incólumes; Afinal, quem teria algo contra a Rosinha da Tijuca ou o Chaveiro Popeye?

Tuesday, February 14, 2012

Magritte




Magritte é célebre por suas pinturas surrealistas, mas em meu Magritte preferido não há homens alados nem excesso de guarda-chuvas e talvez, até, um cachimbo seja mesmo um cachimbo.

Simplesmente amo estes dois quadros. Enxergar surrealismo aqui é forçar a barra, afirmar que é uma cena noturna sob um céu diurno é desconhecer crepúsculos.

Abaixo, minha "leitura" deles, em foto tirada na minha aldeia Grajaú.