Wednesday, March 30, 2011

Rebouças




Sempre me atormentou que muitos botequins desta cidade não sejam tombados. Por ocasião deste quiproquó que foi o tombamento do restaurante Antiquarius, o poeta Alexei Bueno, com sua inteligência e contundência contumazes, esclareceu em carta recente para O Globo: não existe tombamento de uso, ou seja, pode-se tombar o imóvel, mas não a atividade nele exercida. Assim, o Bar Lagoa é tombado por causa do seu interior art déco, mas o Nova Capela, oh infâmia, não.


Isto poderia mudar, não? Soube que Guilherme Studart, que há anos organiza o Rio Botequim, está mexendo pauzinhos neste sentido. Seria uma discussão (e uma luta) que me interessaria imenso.


Enquanto isso, os botequins vão se descaracterizando, quando não viram restaurantes a quilo, de fast food ou pastelarias. Claro que na Zona Sul, onde rola mais grana, isso se dá com mais frequencia.


O Bar Rebouças, situado no Jardim Botânico, sobrevive heroicamente. Tem Heineken, é verdade, o que acho uma dádiva, tem seleção de cachaças mineiras, isto é, está consciente que atende a uma galera mais sofisticada. Mas é boteco, é pé-sujo, daqueles tipicamente situados (escondidos para ser mais exato) atrás de ponto de táxi.


Parece que o forte, para além do minúsculo ambiente (quase b.d.f.) e da simpatia do casal Gertrudes e Seu Alberto Conceição, do Porto aquela, de Vizeu este, são os sanduíches. Como cheguei cedo, fui de jiló. Acreditem: cozido em água e sal e servido com cebolas e ervas picadas para amainar o amargor, é sensacional. Volto em breve.

Friday, March 25, 2011

We CAN



Corre à boca pequena que o rock progressivo é... uncool. Provas? A capa clássica do Genesis Live (73): o guitarrista Steve Hackett toca... sentado. Quer mais uncoolness que isso? O cara não faz caras e bocas, que mesmo o mais incipiente tocador de air guitar (eu, por exemplo) faria. Outro? A banda canadense Rush já foi votada a banda mais uncool do rock.

Deixa quieto, deixa a gente. Talvez em, assim sendo, sejamos, fãs e músicos, verdadeiramente cool, alheios a badalações e clubinhos e afetações.


Ou não. Who cares?

Mas se tem uma banda de rock progressivo verdadeira e insuportavelmente cool é o Can. Aliás, o Can só é progressivo porque este termo é elástico e promíscuo o bastante para abranger a doçura cristalina de Annie Haslam e a loucura destes alemães.

Pegue o Tago Mago (1971) e Ege Bamyasi (1972), músicas como "One More Night", "Vitamin C", "Soup", "Mushroom", "Oh Yeah", "Halleluhwah". Nossa, esses são a essência do cool. Não estou dizendo que isso é bom ou ruim, questão de gosto, digo que são medularmente cool, a ponto de poderem servir como exemplo desta palavra tão elusiva quanto esta: cool.

Enquanto na maioria das bandas neguinho brigava no estúdio para fazer o seu instrumento soar mais alto, aqui parece o contrário. Parece que cada um quer desaparecer. O guitarrista desamplifica sua guitarra ao máximo e, obviamente, evita solos contundentes. O baixista, de ordinário o mais cool da banda (pense John Entwistle assistindo ao Pete pular, ao Keith quebrar, ao Roger deseperado gritar) é um monstro. Das sutilezas. O tecladista, e estamos falando de banda progressiva da primeira metade dos anos 70, não usa mellotron, não usa moog, sei lá o que esse cara usa. Mas está sempre lá. E sem ele, no we can't. E o baterista, aquele que é só pra fazer a cozinha, parece levar a banda nas costas. Mas não é isso. Isso seria tão heróico, tão uncool. E o Suzuki? Este dispensa. Mestre. Raivoso quando tem que ser. Parece querer sempre desparecer, não estar lá. Canta de trás pra frente. Consegue mais com menos.


Aliás, reside aí o segredo (um dos) desta banda: mais com menos. Mestres absurdos da modernidade que são. Pais de Radiohead, Midlake, Sigur Rós, Arcade Fire e todas as bandas que querem soar angustiadas.


Mas o Can não é angustiado. É cool.


Mas, cuidado. Approach with care, don't try this at home. A música do CAN, altamente hipnótica, é música de celebrações. Não as oficiais, luminosas, mas as da noite. É uma música que te induz a excessos, bebedeiras, orgias. Noites e noites em claro. Unspeakable rites.

Monday, March 21, 2011

Viva S. José! II - More pix




Corram, corram que vem aí a bênção!

Viva S. José!




Exatos dois anos postei sobre o santo de minha devoção. Eu, ateu convicto e convencido, sou devoto de São José, com muito orgulho, tal qual meu pai, ainda mais ateu, é devoto de Santa Rita. Ainda mais devoto.

Este ano fui à Igreja com a mãe. Eu adoro essa igreja, barrocona, ficava tão próxima ao Morro do Castelo, hoje fica próxima das Barcas e do Terminal Menezes Côrtes. Vantagem de se morar em Niterói: a ela chego... a pé. Sim, apenas a gostosa travessia de barca me dela separa.

A missa estava cheia. Os fieis, concentrados. O padre celebrante, Monsenhor Mota, é de Niterói, e completa meio século de padrado. Disse que jamais desta esquecerá. Valeu o carinho. Ateu quase convicto, longe de ser católico, emocionam-me manifestações genuínas de fé. Amei.

Isso tudo não parece Goa? É como se fora.

Saturday, March 12, 2011

O Papa-Angu

Aqui no Brasil, comida de escravo era tacanha e ruim, somente o mínimo para que os então chamados "fôlegos-vivos" pudessem continuar de pé, cumprindo suas tarefas em jornadas desumanas. O que comiam aqueles homens? Ao acordar, de madrugada, cachaça e café. No almoço (que era de manhã), feijão azedo e, invariavelmente, angu. No jantar (que era às 2 da tarde), mais do mesmo. O angu, portanto, ficou associado à comida de escravo. Os negros escravos eram chamados de papa-angu. Quando alforriavam-se faziam questão de duas coisas: usar sapatos, para que ficasse clara a sua nova condição, e, claro, parar de comer angu.

O Dantinho é um papa-angu. Adora. É o único prato salgado que talvez rivalize um pouco com a geleia de mocotó.

Em São Paulo, descobrimos em viagem recente, chamam angu de... polenta mole! É mole? Pelo jeito é.

Aqui em casa, em que pese o nome carcamano do mocinho, angu é angu mesmo. Sem caroço, com muito orgulho. E Dante é um papa-angu de primeira.

Thursday, March 10, 2011

Museu do Inconsciente






Hoje soa muito natural, clichê quase, falar em terapia ocupacional, arteterapia. Mas quando a jovem Nise recusou-se a dar choques em um paciente com problemas mentais, eram os choques e a lobotomia moedas correntes nos tratamentos neurológicos / psiquiátricos. Tratamentos menos terapêuticos que punitivos. Dir-se-ia uma raiva, vontade de anular aquele que não se encaixa nos moldes sociais. Encaixa-te ou anulo-te, arranco-te um naco do hipocampo, dou choques em todo o teu corpo para que te curves à minha vontade.

Nise da Silveira recusa-se a dar o choque e oferece ao indivíduo pinceis, telas, papeis, crayons. Nasce uma abordagem que faria história e que continua atual e procedente.

Quando Nise envia alguns dos trabalhos a Jung, este queda-se encantado, principalmente com as mandalas. Ele vê nelas uma tentaiva do self, por dilacerado que esteja, de organizar-se.

Estudante de Psicologia em 1988, tive a honra de conhecer Nise da Silveira em uma palestra na UERJ, já totalmente desapontado com o curso e com a faculdade. Acompanhava-a o célebre Fernando Diniz, um dos artistas mais emblemáticos da instituição. Fiquei tão positivamente impressionado com suas palavras, com a presença do Fernando, aquilo foi um sopro de renovação tão grande que me animei a prosseguir com os estudos. Depois, a vida deu suas voltas e acabei mesmo largando. Mas suas palavras e presença marcaram-me.

O Museu do Inconsciente, no Engenho de Dentro, é um museu vivo, pois que espaço aberto para que os pacientes venham e realizem, sob supervisão não controladora, os seus trabalhos. Achei o acervo em exposição magnífico, mas um tanto acanhado. Fica-se com vontade de ver muito mais. Mas aí, claro, infelizmente, esbarra-se nos problemas de sempre: esta é um cidade que prefere fazer museus novos a cuidar dos já existentes. Os paineis acerca do centenário da Nise da Silveira são muito bem feitos, muito elucidativos. Visita recomendadíssima.

Quarto de Despejo


Toda casa -- casarão, casebre ou casucha -- terá o seu quarto, ou canto, da bagunça. É aquele espaço onde amontoamos o que um dia (**yaaawn**, preguiça) será devidamente ajeitado, catalogado, posto em seus devidos lugares. Um dia, hoje não.

O daqui de casa fica nos fundos. Excavações recentes levadas a cabo por arqueólogos da Universidade de Trípoli atestam que lá funcionavam as tais das "dependências sociais", eufemismo para quarto de empregada. Os moradores anteriores fizeram ótima obra e nos legaram um quarto a mais. A bagunça é, basicamente, minha. Quando vem visita, Bia, rubra de vergonhas, veda a entrada com saibro e cimento.

A foto é recente. Contemplem à esquerda um cachorrinho do Dante, que pifou (o cachorro, não o Dante), pondo-se a latir baixinho infinita e roucamente. Vejam as pastas de onde transbordam provas e exercícios, pedindo arrumação que teria sido feita neste Carnaval. Vejam a velha mochila preta, aposentada por invalidez. E... êpa!, que monte de pelo e dengo é o bicho ali à direita???






Apesar de sutilíssimo, o clique do celular é suficiente para despertar a Isolda, cujas orelhas têm mais terminações nervosas que as de um coelho.

Tuesday, March 08, 2011

Niver 2 Anos






Com um pequeno atraso de quase três meses, um registro da festinha do molecote que completou 2 anos. Foi tudo low-profile, não foi a festança do ano anterior. Mas o que vale é que ele sorriu bem mais!

Sunday, March 06, 2011

Miranda



Colecionador completista de Michael Nyman, tão logo vi que saíra CD do Michael com um tal de Motion Trio, grupo polonês de acordeão, interessei-me, claro.

Essa história de completista gerara decepção recente: ouvir a voz de David McAlmont em diversas músicas instrumentais de Michael Nyman, no CD The Glare. Nada contra a voz do sujeito (se bem que exageradamente melíflua), tampouco contra a releitura / desconstrução de obras: a obra é aberta, está aí para isso. Mas simplesmente não gostei. (Eu não gostei, a Bia de-tes-tou!, e mandou tirar, em seu exagero característico.)

Mas aqui a história é diferente. Ouvi o CD pela vez primeira na rua, andando apressado para o clube, onde encontraria Bia e Dante. E, daí, o raio! Nossa, que coisa linda!

Houve um detrator a dizer que a música de Michael Nyman é tão bonita que fica bem até em acordeão. Houve quem dissesse que parece que a música fora feita para acordeão! Serão duas maneiras de elogiar, às quais, aqui, adiciono a minha.

A música que selecionei é a "Miranda", uma das minhas preferidas de uma das minhas trilhas preferidas, o Prospero's Book. Foi exatamente graças a esta música, junto a outras duas da mesma trilha-sonora, que aprendi, em 1997, a amar incondicionalmente a música de Mr. Nyman. Quando fazíamos sessão de slides com nossas fotos de Veneza, era esta a nossa trilha. Não nesta versão, claro, que não sonhava em existir, mas na original.

Aqui, no vídeo, além do Michael, acompanha o trio - Janusz Wojtarowicz, Paweł Baranek and Marcin Gałażyn - o fiel escudeiro trombonista Nigel Barr.

Cortiços II



Ao contrário daquele do post anterior, construído, parece, para ser cortiço, este prédio, belíssimo, foi estação de trem, Estação Ferroviária Francisco Sá, inaugurada em 1922. Teve sua função usurpada com a inauguração da Leopoldina, apenas quatro anos depois. Vê-se que não é de hoje o desperdício com o dinheiro público. Não sei bem o que sucedeu ao prédio imediatamente depois. É certo que foi jogado na rua da amargura.

Hoje, entretanto, parece melhor conservado que a Leopoldina e situa-se mesmo em área mais amena, ainda que não do agrado de muitos: ao fim da Rua Ceará, rua de clubes de motoqueiros e de baixíssimo meretrício.

Curioso que, ao menos para mim, os cortiços, tão demonizados no passado, hoje parecem-me cheios de charme. Sei que parte disso se dá em função de sua arquitetura. O prédio está protegido por tombamento.

Saturday, March 05, 2011

Cortiços

Ali na Ponta da Areia, em Portugal Pequeno, bem próximo ao Decolores, este belo cortiço, inteirinho e felizmente tombado pelo Patrimônio. Da década de 30, quando os cortiços já eram proibidos por lei. Para burlá-la, chamaram às casinhas de "quartos de alugar". Banheiro e lavanderia coletivos.


Vi de fora. Próximo passo é tomar cervejas nos, nesta ordem, Milagres, Trilhas, Pavarotti, Decolores e gentilmente bater à porta de uma das casinhas pedindo um copo d'água.
Assim que eu fazia no interiorzão do país...

Não digo que "cortiços" vá virar tag aqui, mas tem outros que desejo conhecer e fotografar : dois perto do Jambeiro, sobradões antigos, um não tão velho em Pendotiba, e, claro, aquele da Visconde de Santa Isabel, no Grajaú, parte da minha vida.


E, depois, explorar, condignamente, os da Senador Pompeu, inspiradores de Aluísio de Azevedo.

Tuesday, March 01, 2011

Marvelous Toy



A canção "Marvelous Toy" abre o CD "Peter, Paul and Mommy", um dos melhores discos infantis de todos os tempos. Já li mesmo, em crítica por aí, que seria esta, porventura, a mais bonita música para crianças... ever! Exageros e paixões à parte, ela tem algo em comum com "Quem Mora", a linda canção que abre os trabalhos do CD do Grupo Olá, também ele um dos melhores de todos os tempos. Ambas são composições originais (no sentido de não tradicionais), ambas mexem com a fantasia, ambas instigam a imaginação (o gato usa sapato, o marvelous toy zips, bops and whirrs), ambas anunciam a sequencia de ótima música que está por vir.

Pois não é que Dante encontrou seu marvelous toy? Antes o caminhãozinho entoava uma melopeia coreana que nos deixava a todos loucos. Quando trocamos a pilha, ele parou de cantar e passou a... piscar! Vai entender... Mas ficamos no lucro.

Homenagem a Seu Loeffler








A viagem foi há cinco anos. Leiam post abaixo.